Tuesday, December 13, 2005

Individual

Há sempre a tentação de explicar. Dizer com outras palavras a mesma coisa até que não restem dúvidas. Repetir até ao cansaço o sim e o não de cada pensamento e sublinhar com gestos inequívocos a pressão da ideia sobre o nada. Há sempre um desejo de comunicar. Passar para o outro a intenção sublime que, por momentos, parece ser a geradora do movimento emocional. Por vezes parece que o texto vai explodir na referência certa que leva o rosto a voltar-se e dar-lhe o segundo de prosaica atenção. Mas não é bem assim. Nunca é assim. E é animador que não sendo assim, isso seja assim como deve ser. Porque o deve ser não é um deve ser como deve ser. Gosto do indivíduo. Indivíduo é aquele que não é cópia de outro indivíduo, clone de si, de uma realidade que a indústria quer comercial. Indivíduo é a composição diferente de uma massa original, múltiplo de si próprio, diferente sem ser diferente, orgulhoso sem orgulho, faccioso sem facção, falso sem mentira, sábio sem sabedoria. Não se trata, portanto, de explicar. Trata-se de verter no oceano da memória mais umas gotas redundantes de emocionada razão. Trata-se de levar para o outro lado uma carga que quer o lugar de semente da diversidade. Dentro do tempo, dentro do rosto, dentro do momento. Nunca sabemos em que lugar vai colocar-se a nossa próxima palavra. Como também não sei de onde virá a palavra nova que me fará virar a atenção, o prazer e a ternura.

Prólogo